sábado, 11 de março de 2017

A noite mais assustadora da minha vida



Desde criança meu pai sempre me levava às matinês (sessão de cinema nas tardes de domingo). Me tornei cinéfilo por influência dele.

Gostava tanto de cinema que às vezes “fugia” de casa durante a semana, à noite, para ver qualquer filme que fosse. Naquela noite, sai de mansinho, com o dinheiro “contadinho” e fui ao cinema para assistir ao filme na sessão das 20:00. Eram três quilômetros da minha casa até o cinema e eu fui a pé, pois não tinha linha de ônibus no bairro onde morava. A vontade de ver o filme era muito maior que o cansaço da jornada, ida e volta.

Lá chegando, vendo os cartazes dos filmes (naquela época não tinha internet) vi que naquela noite passaria “O Conde Drácula”. Pensei: “caramba... filme de terror... Fazer o que? Voltar para casa sem ver um filme? Assistirei a este mesmo”.

Ao término do filme, ao sair da sala de projeção, já ouvia o ribombar dos trovões, precedido pela intensa luminosidade dos relâmpagos. Como consequência, a chuva caía a cântaros. Pensei: “e agora? Esperar a chuva passar não é uma opção”! Vou de ônibus para o bairro da Velha. Quem sabe ao chegar no destino, a chuva já terá passado... (lembrem-se: relâmpagos, trovões, vento assoviando, vampiros...)

Na minha cidade tem uma rua que passava por um morro, ligando dois bairros. O bairro da Velha e o bairro do Bom Retiro (o meu bairro). Do cume do morro em direção ao bairro Bom Retiro, além da rua que serpenteava pela encosta do morro, tinha uma via para pedestres, ou seja, duas opções de descida.

Ao chegar na parada de ônibus ao pé do morro, a chuva tinha cessado. Mas os relâmpagos não. Pensei: “que sorte... vou dar uma “acelerada” morro acima para ver se consigo chegar em casa antes da próxima chuvarada.

Só que eu esquecera de um detalhe. Naquela época as ruas, além de serem mal iluminadas, as poucas lâmpadas existentes eram vítimas dos moleques arruaceiros que as usavam como alvo para os projéteis arremessados pelos estilingues. Na subida do morro, correu tudo bem. Naquela parte haviam muitas casas, o que ajudava na iluminação. Mas quando cheguei no alto do morro o calafrio “bateu”. A vertente em direção à minha casa, que ficava no sopé, não tinha nenhuma habitação. E eu sabia que poucas ou nenhuma lâmpada sobreviviam naquele lugar.

Para piorar a situação (lembrem-se que ainda estava “assombrado” pelo filme e haviam os relâmpagos que continuavam com sua fúria resplandecente) e para degenerar as minhas expectativas de vez, lembrei que havia a "curva fria", onde um senhor cometera suicídio e várias pessoas afirmavam que ao passar pela “curva fria” à noite, ouviam seus gemidos e lamentos.

Pela rua não vou passar. Vou descer a ladeira pela via dos pedestres. A via fora construída como se fosse uma trilha em meio à floresta existente na região. No lado direito de quem descia, a encosta. E no lado esquerdo, uma “pirambeira”.  E lá fui eu, de passo acelerado e coração mais ainda, ladeira abaixo. Ao chegar mais ou menos na metade do percurso, um relâmpago iluminou um danado de um vampiro que me esperava de braços abertos bem no meio da via. Que “cagaço”! Voltei correndo morro acima e ao chegar no cume, “peguei” a estrada sem querer saber de alma penada na “curva fria” e “desembestei carreira” morro abaixo murmurando o tempo todo: nunca mais vou “fugir” no meio da semana para ir ao cinema.

No dia seguinte, um sol maravilhoso depois da tempestade. Arrumei coragem e subi a via de pedestres, pois agora, mais consciente da realidade, não podia acreditar que um vampiro pudesse ter tentado me morder naquele caminho. Ao chegar no local, havia uma pequena árvore frondosa que caíra sobre a via, do alto da encosta para baixo, certamente por causa da chuva que solapara suas raízes. E assim sucedeu que a árvore caída “transformou-se” num vampiro causando a noite mais assustadora da minha vida.

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