sábado, 11 de outubro de 2025

O Risco Institucional Embutido no Paradigma da Reeleição e Indicação de juízes

 A Constituição brasileira adota uma regra muito debatida: o Presidente da República pode ser reeleito uma vez consecutiva para o mesmo cargo, ou seja, um mandato de 4 anos, seguido por recondução por mais 4 anos. Após isso, ele não pode concorrer ao mesmo cargo de forma imediata, mas nada impede que, em eleições futuras, ele retorne ao poder depois de intervalos políticos. 

Esse arranjo, em princípio legítimo dentro da democracia, abre uma janela para o que podemos chamar de “onda de perpetuação indireta de poder”, especialmente quando o presidente, enquanto no exercício ou depois dele, indica magistrados para o Supremo Tribunal Federal (STF) ou outros tribunais superiores.

Imagine o seguinte ciclo:

1. O presidente alcança mandato e, sendo reeleito, estende sua permanência no poder.

2. Durante esse tempo, indica ministros ao STF (ou outras cortes), cujos mandatos são vitalícios ou têm longa duração e são independentes do cargo político.

3. Futuramente, se esse ex-presidente voltar a concorrer, ou influenciar o processo político de outras formas, poderá contar com o apoio institucional desses magistrados que participou de escolher.

4. Esse apoio não precisa ser explícito ou aberto, muitas vezes, ele surge pela afinidade institucional, pelas relações políticas ou pelas decisões judiciais que, direta ou indiretamente, beneficiam interesses ligados ao poder já exercido.

5. Assim, uma “rede de influência” se consolida, comprometendo a imparcialidade, enfraquecendo a separação entre Executivo e Judiciário e favorecendo práticas de proteção mútua.

Esse ciclo cria um efeito perverso: o “feitiço vira-se contra o feiticeiro”, ou melhor, quem estava no Executivo pode, com o aparato institucional construído ao longo do tempo, garantir injunções favoráveis, medidas protetivas e decisões benéficas quando for conveniente. É como se parte do Judiciário acabasse funcionando como guardiã de interesses políticos.

Na prática, como muitos observam, vemos esse fenômeno emergir: ministros que manifestam uma “simpatia judicial” por quem os indicou, decisões que favorecem aliados, atrasos ou contenções em casos sensíveis contra o próprio poder. Tudo isso corroendo a confiança no ideal constitucional de equilíbrio entre poderes.

Se a Constituição permite apenas uma reeleição consecutiva, isso por si só não garante a renovação do poder nem coíbe ambições de longo prazo. A verdadeira blindagem institucional estaria em regras mais robustas de independência judicial, transparência na nomeação e mecanismos de responsabilização que impeçam que tanto presidente quanto magistrados atuem em conluio político.

Em resumo: o modelo atual combina reeleição (mesmo que limitada) com nomeações judiciais que dificilmente se desligam da política. O resultado é um sistema no qual “a lealdade institucional” pode suplantar “a imparcialidade jurídica”, e é justamente esse paradigma que devemos criticar, apontar e buscar corrigir.